As coisas que perdemos no fogo, de Mariana Enriquez

"As queimas são feitas pelos homens, menina. Sempre nos queimaram. Agora nós mesmas nos queimamos."

Nota: ⭐⭐⭐

Editora: Intrínseca

Voltar a ler algo do gênero de terror sempre acende meu anseio pela leitura. E, particularmente, todo ano acabo esbarrando em algum autor ou autora que ganha espaços na minha enorme lista de leitura. Este ano, esse título ficou com a argentina Mariana Enríquez.

Entretanto, o terror que você encontrará nas páginas de "As coisas que perdemos no fogo" é diferente do usual. Os 12 contos presentes nesta obra trazem uma atmosfera perturbadora, densa e ainda mais aterrorizante para mim: real. Ao longo dos contos, somos pegos por uma sensação de que o medo ali tende a ser sobrenatural, mas somos subvertidos ao medo do real, seja o medo ao andar sozinho na rua escura voltando do trabalho, seja o medo do assalto, da violência sexual, das pessoas, das suposições que fazemos sobre elas, e entre outros.

O que me destacou na obra também é como as personagens dos contos são socialmente invisíveis, onde o cotidiano delas se torna o pesadelo de suas histórias. O bom é que em grande parte dos contos, esses clímax e o final atingem seu objetivo. Mas, em alguns contos, senti que terminam de forma repentina, o que, na minha visão, desanimou em partes.

Por fim, quero trazer uma reflexão sobre o fogo presente na obra. Acredito que a simbologia do fogo no título da obra é associada ao inquietante. O fogo, ainda como símbolo positivo, é o elemento purificador, mas ele também obscurece, sufoca e destrói. Nos contos, você sente que essa degeneração do "fogo" está presente na psique e no desenrolar da trama das personagens, como se no começo da história uma pequena fagulha é acesa, para que no final se torne um incêndio. E cabe a nós dizer e interpretar dos contos se este incêndio veio para purificar ou devorar a psique das personagens.

Desta forma, meus contos favoritos foram "O quintal do vizinho", "A casa de Adela", "O menino sujo" e "As coisas que perdemos no fogo". Vale muito a leitura para quem quer conhecer mais sobre a literatura latino-americana e ter uma leitura curta.